Responsabilidade por falhas em eventos e serviços

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9/5/20253 min read

Autora: Dra. Ellen Santana — especialista em Contencioso Cível e Direito do Consumidor

O setor de eventos e lazer movimenta bilhões de reais no Brasil e se consolidou como um dos pilares da economia de serviços. Casamentos, formaturas, shows e festas corporativas são contratados com alta expectativa, e qualquer falha pode gerar frustração ou litígio. Contudo, o Judiciário brasileiro tem firmado posição de que nem toda insatisfação do consumidor gera indenização por dano moral.

Esse entendimento busca equilibrar proteção ao consumidor e segurança jurídica para fornecedores. Afinal, condenações automáticas poderiam inviabilizar o setor, ao mesmo tempo em que não se pode tolerar falhas graves que comprometam a dignidade ou causem prejuízo concreto.

Desenvolvimento

1. A distinção entre “mero aborrecimento” e dano moral

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem reiterando que nem toda falha contratual em serviços de eventos se traduz em indenização moral. A famosa tese do “mero aborrecimento” limita reparações aos casos em que há efetiva violação de direitos da personalidade (honra, imagem, integridade psíquica).

No AgInt no REsp 1.655.212/SP, a Corte deixou claro que situações de desconforto ou frustração sem maiores consequências não configuram dano moral indenizávelSTJ, 2019.

2. Exemplos práticos

  • Som e iluminação: falhas técnicas pontuais podem gerar descontos proporcionais, mas dificilmente justificam dano moral se o evento ocorreu em condições razoáveis.

  • Buffet: atraso ou troca de pratos pode ser considerado falha parcial do serviço, ensejando restituição parcial do valor pago.

  • Fotografia e filmagem: perda total do registro do evento pode, sim, configurar dano moral, pois afeta diretamente a memória e a dignidade dos envolvidos.

Essas distinções mostram que a análise deve ser caso a caso, observando proporcionalidade e razoabilidade.

3. Base legal

O Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seus arts. 6º e 14, estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor por falha na prestação de serviços. Isso significa que, em regra, não é necessário comprovar culpa: basta demonstrar o defeito e o nexo de causalidade.

Entretanto, a indenização por dano moral só é cabível quando a falha ultrapassa o mero descumprimento contratual e afeta valores existenciais do consumidor.

4. Posição consolidada do STJ

A Quarta Turma do STJ, em 2020, reforçou que o mero aborrecimento não deve ser confundido com dano moralSTJ, 2020. O tribunal tem buscado uniformizar decisões para evitar a banalização do instituto, que poderia comprometer sua função reparatória e pedagógica.

Assim, pequenos contratempos devem ser tratados como falhas contratuais indenizáveis apenas na esfera material.

5. Reflexos para fornecedores e consumidores

  • Para fornecedores: a decisão fortalece a importância de contratos claros, cláusulas de contingência e canais de atendimento eficientes. É recomendável incluir previsão expressa sobre prazos de solução de falhas e formas de ressarcimento.

  • Para consumidores: fica evidente a necessidade de documentar adequadamente as falhas (fotos, vídeos, testemunhas) e de buscar solução amigável antes de judicializar.

Conclusão

O entendimento consolidado do STJ é de que a indenização por dano moral exige efetiva violação a direitos da personalidade. Frustrações estéticas ou contratuais menores não geram, por si só, compensação moral.

Isso não significa desamparo ao consumidor. Ao contrário, reforça-se a ideia de proporcionalidade: falhas graves devem ser reparadas com amplitude; falhas menores, apenas no campo patrimonial.

Para prestadores de serviço, o caminho é investir em qualidade, transparência e prevenção de litígios. Já para consumidores, a lição é buscar provas consistentes e diferenciar insatisfações comuns de violações relevantes.

Assinado por Dra. Ellen Santana — especialista em Contencioso Cível e Direito do Consumidor.

Fontes

  • STJ – AgInt no REsp 1.655.212/SP (2019) – link

  • STJ – Quarta Turma afasta dano moral por frustração do consumidor (2020) – link

  • CDC – Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) – Planalto